Muitas foram as pessoas que me
disseram para não dar mais instrução à minha filha, assim como a Esméria
também tinha me dito que de nada me serviria aprender a ler e a
escrever. É claro que não levei em consideração esses comentários,
pois o tempo provou que a Esméria estava errada, embora eu tivesse
duvidado disso algumas vezes, e também porque achei curioso que a
maioria dos que falavam que a Maria Clara não deveria estudar, era
formada por brasileiros que a queriam em casamento para si ou para seus
filhos. Encarregado de investigar a minha receptividade à proposta de
um rico sarô de Lagos, um missionário protestante chegou a me mostrar
um livro em que estava escrito que as moças que estudavam muito,
principalmente as que se dedicavam ao magistério, tinham uma triste
sorte, ficavam nervosas, fracas e muito sensíveis às afecções cerebrais.
Só não ri na presença dele porque sou educada, mas disse que eu mesma
já tinha dado aulas durante um bom tempo, na escola do padre Heinz, e já
estava com quase sessenta anos sem nunca ter sido acometida de nada
daquilo. Minha filha ia estudar, ia se formar, ia ser alguém importante,
professora, que é quase tão importante quanto ser rica, pois isso ela
já era sem esforço algum, sem mérito a ser acrescentado.
GONÇALVES, Ana Maria. Um defeito de cor. 34. ed. Rio de Janeiro: Record, 2023. p. 901-902.

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